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Analisando a trajetória do Flamengo nos eSports

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Time de League of Legends do Flamengo disputando a final do CBLoL 2018, maior campeonato da modalidade, em seu primeiro ano de esport (Foto: Reprodução/Riot Games Brasil)

Com 123 anos de história, o Clube de Regatas do Flamengo é, sem dúvida, um dos maiores nomes no esporte brasileiro. Presentes em 12 modalidades além do futebol, o time conta com mais de 32,5 milhões de torcedores em todo o país, além de ser o clube que mais fatura no Brasil, com receita de R$648 milhões em 2017.

Pouco menos de um ano atrás, em outubro de 2017, a empresa anunciou oficialmente sua entrada no esporte eletrônico. A vaga comprada no Circuito Desafiante 2018 foi o primeiro passo do Flamengo no League of Legends, título com o maior número de jogadores no mundo, que também conta com o cenário competitivo mais desenvolvido entre os diversos jogos que integram o meio de esports.

Contratando o maior jogador da história do LoL brasileiro, Felipe “brTT” Gonçalves, a equipe, até então veterana na cena esportiva e novata no esport, anunciou uma escalação com nomes de peso, além de uma importação estrangeira, o coreano Jisu. O “time dos sonhos” conquistou a vaga no Campeonato Brasileiro de League of Legends (CBLoL) aos tropeços, disputando a série de acesso como vice-campeões do Desafiante e vencendo.

Para o CBLoL, alterações pontuais e a importação de um segundo coreano equipararam, em tese, o time aos outros 7 na competição. Em uma campanha com altos e baixos, o Flamengo terminou a fase de pontos em 2º lugar, classificando-se para a Escalada e, posteriormente, para a grande final. Na decisão, se consagrou vice em uma acirrada disputa decidida no 5º jogo — o possível equivalente no LoL aos 45 do segundo tempo.

A derrota na final passa longe de anular a campanha do Flamengo em seu primeiro ano de esporte eletrônico. Com o resultado, o Rubro-negro se torna o primeiro clube oriundo do esporte tradicional a chegar perto de fincar sua bandeira no cenário de esports. Antes dele, o mais próximo era o Corinthians, que fez estreia em uma breve parceria com a Red Canids, no League of Legends. Na ocasião, o Dream Team com dois coreanos terminou o 1° Split do CBLOL 2018 em terceiro lugar.

O Santos usou uma estratégia parecida em sua primeira tentativa, em que foi pioneiro ao firmar parceria com a Dexterity em 2015, encerrando apenas em 2018, quando anunciou sua equipe própria para as classificatórias ao Circuito Desafiante, além de equipes de CS:GO feminino e masculino. O Vitória contou com equipes de CS:GO e de PUBG. Nenhum contou com grandes conquistas em seus respectivos campeonatos, e a estabilidade das marcas no novo cenário ainda é questionada.

Flamengo eSports na final do CBLoL 2018 (Foto: Divulgação/Riot Games Brasil)

O modelo de negócios do Flamengo eSports

O vice-presidente de marketing do Flamengo, Daniel Orlean, afirmou em entrevista ao Mais e-Sports que a intenção do clube nunca foi franquear a marca para outro time. “Nosso interesse era entrar, estruturar um projeto, atrair patrocinadores que atuassem ou não no segmento para que comprassem com a gente o projeto, que deveria ser autossustentável desde o início, e atender essa demanda do público, trazendo mais uma oportunidade pra quem ama o clube e quer opções dentro dessa nova realidade e nova economia.”

A autossustentabilidade do Flamengo eSports foi prioridade desde o princípio e, apesar da preocupação dos torcedores do clube de futebol, pouco ou nenhum recurso do esporte tradicional foi usado no esport. “O conselho do clube aprovou o projeto como inclusão de uma nova modalidade esportiva, e o investimento inicial, que era na entrada no Circuito Desafiante, foi rapidamente pago pelos patrocinadores. Eles acreditaram que poderíamos cumprir o projeto que prometemos, e fizemos isso”, crava Orlean.

Entre outras particularidades do projeto, executado com a gestão da empresa Go4It desde o princípio, o Flamengo eSports foi um dos pioneiros no Brasil em adotar o Gaming Office. O escritório para atletas de esport vai contra a corrente predominante, a das Gaming Houses, formato em que os jogadores moram na mesma casa, que também serve como centro de treinamento. Enquanto a GH facilita o contato entre os atletas e a gestão por parte da empresa, o GO prioriza fatores como a individualidade, permitindo que os jogadores tenham suas próprias casas, apesar da rotina rígida no escritório.

Para o vice-presidente, o caminho escolhido pelo Flamengo é relevante para a campanha favorável, desde o time próprio até o escritório e, principalmente, a formalização. “Todos os nossos atletas estão dentro da legislação, tem CLT e todos os contratos firmados e reconhecidos. Isso pra a gente é bastante relevante. Se um clube pretende entrar, que entre direito, com ética e boa gestão. É necessário seguir a regulação do setor para não trazer a bagunça do futebol pro esporte eletrônico, e ajudar no que ainda não está maduro no esporte eletrônico. Queremos participar. Não queremos ser dominantes, queremos trabalhar juntos e construir um futuro melhor. Que outros clubes também façam isso.”

A escolha pelo League of Legends

O cenário competitivo de League of Legends é um dos mais consolidados no meio, tanto no Brasil quanto internacionalmente. Com 2 eventos mundiais por ano e 14 ligas regionais organizadas pela Riot Games, desenvolvedora do jogo, o circuito é fechado e, por isso, promove estabilidade para investimento, visto que as equipes participantes são definidas previamente e prosseguem na liga durante uma temporada inteira.

Em 2017, LoL foi o esport mais assistido do mundo, com 274,5 milhões de horas acompanhadas na Twitch.tv durante os campeonatos. Em 2018, o Mid Season Invitational, primeiro campeonato internacional do ano, quebrou recordes com a marca de 363 milhões de horas assistidas em todas as plataformas, além de 11 milhões de espectadores ao vivo durante a grande final e 60 milhões no total.

Esse foi o contexto escolhido pelo Flamengo para sua estreia no esporte eletrônico — a liga regional brasileira, o CBLoL, por meio do Circuito Desafiante, segunda divisão que dá acesso à primeira. “Identificamos que o LoL era onde teríamos as melhores demandas e oportunidades”, conta Daniel Orlean. “Porque ele só cresce, porque tem gente interessada, investindo, dando audiência, então foi a nossa escolha, entre várias outras apresentadas.”

Felipe “brTT” Gonçalves, maior nome do League of Legends brasileiro, cumprimentando a torcida na final do CBLoL 2018 (Foto: Divulgação/Riot Games Brasil)

O Dream Team rubro-negro

Quando se pensa em esport no Brasil, é intuitivo pensar em três nomes: Gabriel “FalleN” Toledo, Epitácio “TACO” Pessoa — os dois do Counter Strike, modalidade na qual os jogadores foram dominantes na SK Gaming — e, especialmente, em Felipe “brTT” Gonçalves, o maior da história do League of Legends brasileiro. Com quatro títulos de CBLoL, 778 mil seguidores no Twitter e 670 mil no Facebook, a grandeza de TT não é medida apenas por títulos, mas por sua influência entre os fãs e a comunidade.

O projeto Flamengo eSports foi autenticado quando o nome de Gonçalves foi confirmado. A importação coreana Park “Jisu” Jin-cheol era o nome mais desconhecido da lineup anunciada pelo rubro-negro — completando o conjunto vinha Eidi “esA” Yanagimachi, ex-atirador com anos de experiência que brilhara como suporte na temporada passada; Danniel “Evrot” Franco, mid laner em ascensão com experiência no Circuito Desafiante; e os ex-companheiros de TT Thulio “SirT” Carlos, caçador bicampeão ao lado do atirador, e o técnico Gabriel “MiT” Souza, que acompanhou os dois anteriores na jornada ao Mundial de 2015, pela paiN Gaming.

“Tivemos a felicidade dele [brTT] ser rubro-negro, né. Isso foi bem interessante”, comenta Daniel Orlean. “Ele é torcedor do Flamengo por conta do avô, e quando apresentamos o projeto ele ficou super animado, veio ajudar a gente a montar tudo isso. Desde o início, um dos motivos foi que percebemos que valia a pena e que poderíamos montar um time altamente competitivo, e foi o que aconteceu.”

Apesar do time de estrelas, a equipe não foi tão bem sucedida quanto o que a torcida esperava em sua primeira campanha, e finalizou o Circuito Desafiante em segundo lugar, vindo à elite do LoL pela série de acesso em uma vitória contra a Team One. Com isso, o clube voltou ao mercado em busca de mais nomes de peso: semanas depois, as contratações de Bruno “Goku” Miyaguchi, mid laner destaque pela ProGaming, e Lee “Shrimp” Byeong-hoon, caçador coreano ex-Dignitas, foram anunciadas para o CBLoL, além da adição do técnico Gabriel “Von” Barbosa, que substituiu Mit ao longo do campeonato.

“Tivemos que fazer mudanças ao longo do caminho para tornar o time mais competitivo e equilibrado. Não digo que os que saíram não fossem bons atletas, mas sabemos que deveria haver um equilíbrio melhor de forças. E isso foi feito”, relembra Orlean. O novo dream team rendeu dúvidas nas primeiras semanas, mas teve a classificação para a final como divisor de águas sobre a força do quinteto. O título, no entanto, foi conquistado pela KaBuM, campeã do primeiro split e agora tricampeã do CBLoL.

A resposta da torcida e o retorno do investimento

Desde o início, o projeto de eSports do Flamengo dividiu opiniões entre a torcida. Enquanto boa parte dos flamenguistas fãs de esporte eletrônico clamavam pela entrada do clube no cenário, reagindo muito bem à iniciativa, uma fração dos torcedores do esporte tradicional torciam o nariz para a ideia de seu time “gastar o dinheiro do futebol” investindo em atletas de videogame.

Apesar disso, a importância massiva do nome rubro-negro foi notada logo nas primeiras semanas de campanha, em que o Flamengo eSports alcançou mais de 50 mil espectadores simultâneos em uma partida de série B de esporte eletrônico — no caso, a estreia no Desafiante, contra a IDM Gaming. O resultado foi mantido e a audiência prosseguiu expressiva durante toda a campanha no CD e CBLoL.

“Somos um clube multiesportivo. Temos 123 anos no esporte e é uma trajetória bem vitoriosa nesses anos todos. O ativo mais importante nisso tudo é a torcida, o que a gente chama de nação rubro-negra, todo mundo que é apaixonado pelo FLA, que consome, que participa, que torce. Entrar no esport veio de uma demanda dos últimos anos do pessoal mais jovem, que perguntava quando o Flamengo estaria presente no esport. O retorno acontece e é expressivo”, garante o vice-presidente de marketing.

Orlean prossegue ilustrando a situação com uma história frequente e compreensível de quem se envolve em diversas modalidades e, principalmente, conversa com diversos públicos. “Temos hoje um número expressivo de torcedores que se interessam. O interesse da torcida foi muito relevante. Há um pouco da galera que veio do futebol e ainda não percebe que são atividades completamente diferentes e que não se conflitam, que podem até se complementar: o filho assistindo futebol com o pai e o pai assistindo esport com o filho, por exemplo. Acontece muito, temos muitos relatos.”

Questionado se os resultados do Flamengo eSports correspondem ao investimento dedicado à equipe, o representante do clube relembra o caminho percorrido pelos jogadores. “Eu acredito que quem é rubro negro quer ganhar sempre, então ficamos tristes de ter perdido na final, mas a trajetória é aquela que tem que ser parabenizada.”

“Ter subido com as próprias pernas é um retorno bacana, mostra que investimos, conseguimos ocupar um espaço no cenário e construir uma história. Agora, somos respeitados, existimos como um time e clube que fez direito, vimos que muitos clubes acabam não tendo sequência no esporte eletrônico, e isso não aconteceu conosco. Isso fez parte de um trabalho muito duro de investimento, de correr atrás junto com os patrocinadores, errando e acertando. Então, fico triste pelo FLA não ter sido campeão, mas ao mesmo tempo feliz por termos conseguido montar um projeto relevante que se mostrou dentro do cenário”, afirma.

(Foto: Divulgação/Riot Games Brasil)

Uma projeção para o Flamengo nos eSports

A entrada ambiciosa no cenário de League of Legends, em que muitas marcas têm tropeçado na busca pela vaga, prossegue sendo o foco do Flamengo, que tem como único objetivo fazer seu nome e ser cada vez mais forte no esport mais relevante do cenário atual. O clube está ciente sobre cenários como o de Counter Strike, Rainbow Six e DotA 2, mas o VP crava que, à curto prazo, expandir para além do LoL não é a intenção.

“Claro que não queremos fechar as portas pra outros projetos, mas eu considero que ainda é cedo. Ainda precisamos aprender dentro dessa modalidade para podermos dar passos maiores, e queremos ser muito relevantes dentro do LoL. Se abordarmos outros agora, talvez a tendência seja perder um pouco dessa força e do aprendizado — mas isso não significa que lá na frente não vai acontecer. Apenas não está nos planos de curto prazo”, finaliza Daniel Orlean.

O foco no League of Legends foi peça-chave para que o clube fizesse o que nenhum clube de esporte tradicional fizesse até então no esporte eletrônico — se consolidar como uma das melhores equipes do Brasil e se tornar referência no segmento. Em tempo reduzido, o Flamengo eSports se equipara a gigantes do cenário e conquista seu espaço, abrindo os olhos de outros clubes e se tornando modelo para que quem busque investir no segmento o faça de maneira sólida.

O competitivo de League of Legends, apesar de ser indubitavelmente mais estável do que o de esports com circuito aberto, não tem sua estabilidade garantida — nas últimas temporadas, gigantes como paiN Gaming, Red Canids e a emergente Team One perderam suas vagas na primeira divisão por baixo rendimento no CBLoL, o que atestou que nome e investimento não garante desempenho ou permanência na elite. Resta saber, nesse contexto, se o projeto do Flamengo eSports prosseguirá sólido para as próximas temporadas — afinal, seguindo a linha de crescimento atingida pelo time em um menos de um ano de existência, a nação rubro-negra tende a prosseguir fazendo barulho no cenário de esports.

Flamengo eSports na final do CBLoL 2018 (Foto: Divulgação/Riot Games Brasil)

O Flamengo eSports tem vaga garantida no CBLoL 2019, que tem seu início previsto para janeiro do ano que vem. Enquanto isso, acompanhe a cobertura do Mundial 2018, que inicia no dia 1 de outubro e tem como representante brasileira a KaBuM e-Sports.

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Evelyn Mackus

por Evelyn Mackus

Publicado em 26 de setembro de 2018 • Editado há 6 anos

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