Marvel vs. Capcom 2 é um jogo extremamente quebrado até hoje. Em termos de League of Legends, ele é o equivalente a ter um campeonato mundial de URF. O jogo chega ao nível de personagens destruírem os adversários em um piscar de olhos com combos absurdos. Mas isso não significa que ele nunca foi competitivo — muito pelo contrário: ele é responsável por algumas das partidas mais insanas que eu já vi até hoje.
Este é o jogo que sempre atordoa minha cabeça quando o assunto é balanceamento em esports. Marvel vs. Capcom 2 conta com 56 personagens para você escolher, mas cinco deles eram tão quebrados a ponto de um bom jogador conseguir matar o trio do adversário só tendo um deles na equipe. Era um festival de combos infinitos e especiais que cobriam a tela. Tudo em uma velocidade que era quase absurda para qualquer boneco em outra posição na tier list acompanhar.
Tudo isso caracteriza Marvel vs. Capcom 2 como um jogo completamente quebrado? Mesmo depois que os profissionais descobriram que trios com Sentinel, Storm, Cable e Magneto podiam destruir com qualquer oponente em questão de segundos? Talvez. No entanto, o mais curioso é que, depois de um tempo, ele continuou a ser um game extremamente competitivo entre os fãs de games de luta. E tinha um motivo bem simples para isso.
O jogo era tão quebrado, mas tão quebrado, que ele deu a volta em si mesmo e os personagens poderosíssimos eram equilibrados entre si. Você podia detonar com um boneco do oponente, mas ele voltava com um potencial altíssimo de virar a partida mesmo assim. Por vezes, bastava acertar um golpe para fazer a virada brilhar na tela (mas exigia uma boa dose de execução aí no meio).
Haviam exceções, é claro. Uma das composições mais arriscadas fora desse metagame foi construída pelo norte-americano Clockw0rk, que fechou sua equipe com Strider, Doctor Doom e Sentinel. Tudo se baseava em dar espaço pro Strider chamar suas orbes e ficar consumindo a barra de vida do oponente mesmo se ele defendesse. Era divertido de se ver e mostrava o ápice de execução e emoção no Marvel vs. Capcom 2 competitivo.
Aliás, recomendo que assista a série abaixo para ver um pouco do que estou falando. Tenho certeza que não vai se arrepender de assistir as cinco primeiras partidas.
Marvel vs. Capcom 2 é, no entanto, uma exceção nos esports. Obviamente ele não é um exemplo para a Riot Games socar ideias mirabolantes, transformar campeões em bonecos bizarramente poderosos e equilibrar o jogo a partir de absurdos. Embora alguns achem o contrário, balanceamento é um conceito complexo que cada estúdio se aproxima com cuidado, especialmente quando temos campeonatos de esports pagando prêmios gigantescos e carreiras de jogadores profissionais que dependem desses resultados.
A Riot afirmou, no mesmo dia que escrevo essa coluna, que é “impossível balancear todos os 148 campeões do jogo”. E essa missão dentro do design de games realmente beira o impossível; mas isso não significa que um desequilíbrio aqui ou ali vai matar o jogo. Metagames são formados assim — alguns inclusive mais chatos de jogar e assistir que outros — mas o problema nunca foi esse.
O problema é quando o estúdio perde a mão no que tá fazendo.
A delicada questão do metagame nos esports
Há metagames e metagames nos esports. Você provavelmente teve o seu favorito em League of Legens, Overwatch ou DotA 2. Mas aí a mão divina dos desenvolvedores resolve mexer no jogo e você automaticamente começa a temer que ele fique chato ou injusto demais para você, não é mesmo?
Em épocas de fliperamas, quando sequer existiam atualizações no game e tudo era resolvido com um novo jogo, a galera descobriu que dava pra jogar com o chefão Akuma em Super Street Fighter 2 Turbo. Este é, inclusive, um dos jogos que cativa jogadores até hoje pelo mundo, inclusive com uma liga brasileira que até hoje resiste ao tempo.
Mas Akuma também era quebrado. Tinha um hadouken aéreo e só isso era necessário para compôr uma vantagem absurda na hora de descer todo mundo na porrada. A solução para a comunidade foi simples: para evitar que todos os campeonatos só tivessem esse boneco, eles baniram Akuma das competições.
Obviamente esses eram outros tempos nos esports. Apesar de tudo, este é um exemplo simples que mostra como o balanceamento é uma delicada questão que, por vezes, é responsável pelo sucesso ou pelo empecilho de um jogo nas competições — e como a comunidade pode se envolver nesse processo.
Um exemplo recente nos esports é a Overwatch League que passou por meses travada em um metagame ao redor de Brigitte. Foram atualizações e mais atualizações da Blizzard para tentar lidar com isso. Quando finalmente os times estavam aprendendo a lidar contra três tanques e três suportes — com a Shanghai Dragons se destacando com a volta da Widowmaker — a empresa colocou o pé na porta e forçou a formação do 2-2-2, com dois tanques, dois DPS e dois suportes.
Mas ficou a dúvida: será que, naquele momento, com os times aprendendo a jogar contra essa composição, realmente era necessária essa mudança?
Por sorte, o League of Legends não passou por uma situação tão crítica assim nos esports. Basta observar a taxa de aparição com cada vez mais campeões nas últimas edições do Mundial. Mas também já presenciamos campeonatos em que as mesmas match-ups eram travadas sem parar no topo, no meio e na selva.
Equilíbrio é algo complicado de se alcançar nos esports. Se nem jogo-da-velha é verdadeiramente balanceado, imagine League of Legends. Ou DotA 2. Ou Counter-Strike. Ou Overwatch. Mas, se for pelo caos, eu fico me perguntando até hoje como seria um campeonato mundial de URF. Só pela zoeira mesmo. Só pra saber como seria o metagame desse festival de loucuras.
Vai que ele é equilibrado e a gente não sabe até agora?